terça-feira, 19 de julho de 2011

O mito do superávit primário

Infelizmente, o resultado verdadeiro dessas operações de soma e subtração tem sido, sistematicamente, um indisfarçável saldo negativo muito grande.

Por Antoninho Marmo Trevisan, www.administradores.com.br

Fonte: http://www.google.com.br/imghp

É muito louvável o fato de a economia orçamentária da União manter-se 1,2 ponto percentual acima do montante necessário à manutenção da estabilidade da dívida pública em relação ao PIB, conforme anunciou recentemente Márcio Holland, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda.

Louvável, mas insuficiente para um país que, como o Brasil, acaba de promover a inclusão socioeconômica de 30 milhões de habitantes e cuja população, agora predominantemente de classe média, está ávida por exercer o direito ao consumo, inerente ao capitalismo democrático contemporâneo.

No entanto, o avanço indicado por Holland mostra-se insuficiente porque, numa conjuntura de otimismo, confiança, baixo desemprego e crescente nível de investimentos, em que há forte pressão sobre os preços, o combate à inflação começa com o equilíbrio fiscal, e este não se soluciona com o superávit primário das contas do governo. É necessário verificar, conforme recomenda a boa e inexorável matemática contábil, quanto se arrecada, quando se gasta, incluindo o montante despendido com o serviço da enorme dívida pública, e quanto sobra ou falta.

Infelizmente, o resultado verdadeiro dessas operações de soma e subtração tem sido, sistematicamente, um indisfarçável saldo negativo muito grande, semanticamente atenuado pelo mito do superávit primário, mas realisticamente nocivo à economia nacional, pois, além de reduzir o aporte de recursos em prioridades como educação, saúde e infraestrutura, é um dos fatores inflacionários. Em decorrência da elevada dívida pública, o governo acaba cortando investimentos e/ou aumentando impostos, medidas com impactos diretos na inflação.

Simultaneamente, para aliviar a pressão sobre os preços, o Copom eleva a taxa básica de juros, aumentando o custo das empresas, onerando os investimentos, tornando mais caro para o bolso dos brasileiros o créditopara consumo e agravando o serviço da dívida pública. Assim, esse estratégia pode aprofundar a queda do nível de atividade e gerar efeitos colaterais negativos, como a intensificação do processo de apreciação cambial e o aumento das despesas do governo com juros, que já alcançaram o montante de R$ 195 bilhões em 2010 e deverão atingir cerca de R$ 210 bilhões em 2011. Cria-se, assim, um círculo vicioso, cuja solução está muito distante do mero superávit primário sempre destacado. Por essa razão, também é preciso considerar que a atual prática de paulatino aumento da Selic não tem sido tecnicamente eficaz para o controle da inflação.

A política econômica do governo mostra-se correta em numerosos aspectos. Isso pode ser comprovado pelo índice médio de crescimento do PIB nos últimos anos, a ampliação expressiva do número de habitantes incluídos no mercado consumidor, a invejável performance no enfrentamento da crise mundial, o menor desemprego na série histórica desse indicador fundamental, o elevado nível de investimentos produtivos externos e as perspectivas positivas para o presente e o próximo ano. Tudo isso, porém, foi feito sobre uma estrutura de Estado antiquada e um marco legal anacrônico. É preciso modernizar a máquina administrativa e, ao mesmo tempo, atualizar o arcabouço das leis que regem a economia.

O mais importante é que se criaram as condições necessárias, inclusive no tocante à confiança interna e internacional, para os próximos passos essenciais: a racionalização e modernização administrativa do setor público, combinada com uma adequada reforma tributária. Teremos, assim, um verdadeiro equilíbrio fiscal, podendo ampliar os investimentos estatais em áreas decisivas, como a infraestrutura, e estabelecendo bases seguras para crescer sem medo da inflação.

Antoninho Marmo Trevisan - é diretor presidente da Trevisan Escola de Negócios, membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e do MBC Movimento Brasil Competitivo.

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