sexta-feira, 13 de maio de 2011

Quando a arte vira (um bom) negócio

Uma banda de Brasília, um cineasta de Pernambuco e uma cooperativa de artesãs do Maranhão. Em comum, o amor pela arte e o fato de terem transformado suas atividades em empreendimentos rentáveis
Por Simão Mairins, Revista Administradores

O início foi como o de qualquer outra banda: um grupo de amigos do colégio tocando em uma garagem para se divertir. A diferença é que, quando a coisa começou a ganhar corpo, mais que bons músicos, os meninos acabaram se revelando, também, grandes empreendedores. Tirando proveito do fato de ser numerosa e seus integrantes terem formações profissionais nas mais variadas áreas, a brasiliense Móveis Coloniais de Acaju tem se firmado como banda-empresa, conquistando fãs em todo o Brasil e dando uma lição de como o casamento entre arte e negócios pode dar certo.

"É possível viver de arte? Sim, é", diz Gabriel Coaracy, baterista da Móveis. Mas, para quem pensa que é fácil, ele vai logo fazendo uma ressalva. "Dá muito trabalho! É um esforço sobre-humano", brinca o músico.

Diferentemente do que é comum ver no show business, a Móveis Coloniais de Acaju optou pela autogestão, dividindo funções administrativas entre os integrantes de acordo com o perfil de cada um.

"Chegou uma hora em que passou a ser impossível não pensar a banda empresarialmente", conta Gabriel. Desde então, cada integrante teve de se dividir entre os instrumentos e alguma função administrativa. "Eu sou publicitário e trabalho muito com internet. Então, juntamente com o Eduardo (gaita, escaleta e teclados), cuidamos da parte virtual da banda. O André (vocalista) faz toda a parte de arte. Já o BC, nosso guitarrista, é economista e faz todas as prospecções financeiras", conta Gabriel.

Foto: Simão Mairins

Show da Móveis Coloniais de Acaju

Envolvidos com o mundo dos negócios, os músicos também têm procurado diversificar a banda enquanto empresa. "A gente já começou a experimentar a produção de áudio publicitário e estamos pensando em atuar como palestrantes. Tem também a nossa loja virtual, com a qual fizemos a primeira experiência agora e superou as expectativas", conta Gabriel. Além disso, o grupo realiza, em Brasília, o festival Móveis Convida, que, na edição de 2010, além de apresentar bandas do circuito independente, ofereceu oficinas e palestras sobre o mercado cultural.

Artesãs empresárias
No Maranhão, outra iniciativa coletiva mudou a vida de 21 mulheres. Com método e muito trabalho, um grupo de artesãs da cidade de Imperatriz conseguiu somar forças e criar um produto que, hoje, é sucesso no mercado nacional e uma garantia de renda para elas.

Organizadas legalmente na Comadri - Cooperativa das Mulheres do Artesanato de Imperatriz, as artesãs trabalhavam, inicialmente, com bordados e costuras. Para entrar com mais força no mercado e viabilizar a comercialização em larga escala, elas criaram uma linha de produtos cuja matriz é o coco babaçu, matéria prima bastante comum na região. São peças refinadas de decoração de ambientes cuja demanda é bastante alta entre os consumidores de artigos de luxo.

Foto: Divulgação

Trabalho da cooperativa Comadri

As artesãs se orgulham de dizer que a cooperativa foi fundada de forma independente e se mantém forte graças ao afinco de cada uma. "Depois de fundamentada (a cooperativa), a gente recebeu algumas propostas de apoio do município e da câmara dos vereadores, mas, a iniciativa mesmo foi das mulheres", conta Kelly Almeida, uma das cooperadas.

Na Comadri, todas as artesãs são donas do negócio e os lucros são divididos igualmente. Administrativamente, elas contam com uma diretoria executiva, uma gerência comercial e um setor de produção, que tem uma gerente específica, responsável pelo planejamento e o controle de qualidade dos produtos. "No dia a dia da cooperativa, cada uma tem o seu cargo e sua forma de trabalho. Mas, independente de ser presidente ou operária, o peso nas decisões é o mesmo. A diretoria, pelo estatuto - aprovado por todas no ato de fundação, tem carta branca para tomar decisões. Só que nos casos mais complexos, nós realizamos votação", explica Kelly.

O self-made man
Se no caso da Móveis Coloniais de Acaju e da Comadri o trabalho coletivo é que fez a diferença, para o cineasta Wildes Sampaio, o que valeu mesmo foi saber se virar desde cedo. "Eu penso em arte desde os 12 anos, quando dirigi meu primeiro filme na escola. Aos 13, comecei a ver o cinema como uma atividade lucrativa", conta Wildes.

Hoje, o cineasta tem sua própria produtora e pode se orgulhar de um currículo recheado. Em 2005, aos 16 anos, ele criou o Cine Sertão, único projeto do Norte-Nordeste selecionado pela Fundação Roberto Marinho para compor o time do programa Geração Futura, no Canal Futura. Em 2007, foi selecionado para o Festival Internacional de Televisão, no Rio de Janeiro. Entre 2008 e 2009 foi indicado duas vezes ao Prêmio Brasil de Cinema Infantil, recebeu o Prêmio Amigo do Cinema Infantil e foi nomeado Titular de Cinema da Fundarpe - Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco.

Foto: divulgação

Wildes Sampaio roda filme no sertão de pernambuco

"Eu posso dizer que consigo viver feliz e satisfeito fazendo da minha arte o meu negócio. Quando queremos crescer, temos que saber mesclar o artista que existe em nós com empreendedorismo e determinação. Todo esforço e trabalho, uma hora, será recompensado", afirma Wildes.

Administrando o negócio
Para o artista, fazer arte não é problema. Fazer negócios, às vezes, é. Como explica Verônica Ribeiro, gestora do Programa de Artesanato do Sebrae Paraíba, a falta de preparo para a gestão, geralmente, é o maior calo na hora de iniciar um empreendimento. "Aquilo que se produz é feito com muita facilidade. Entretanto, muitas vezes, ele não sabe vender o produto", explica.

Na Móveis Coloniais de Acaju, o apoio na parte administrativa veio de outros iniciantes. Quando começaram a se estruturar como empresa, os músicos-empresários contrataram os serviços de consultoria da AD&M, empresa júnior de Administração da UnB - Universidade de Brasília, que elaborou o modelo de gestão da banda. "Com esse modelo a gente cresceu muito", afirma Gabriel Coaracy.

"Damos as informações necessárias para o empresário conduzir, de forma consciente, o seu negócio. Além do mais, temos uma consultoria mais acessível para empreendedores iniciantes, visto que sai muito caro investir em uma grande consultoria", explica Lear Valadares, assessor da presidência da AD&M.

Na Comadri, para as coisas darem certo, dois fatores foram fundamentais: primeiro, estabelecer as regras de como funcionaria a sociedade e dividir o trabalho de gestão. Em seguida, o que a cooperada Kelly cita como crucial: a capacitação das artesãs para a atividade empresarial.

"Ao longo do primeiro ano da cooperativa nós tivemos acesso a nove cursos do Sebrae, todos na área de gestão. Foi a partir daí que essas mulheres deixaram de ser simples donas de casa, conseguiram entender seus direitos e deveres e se firmaram como empreendedoras", afirma Kelly.

No fim das contas, independente de qual seja a arte, administrá-la bem é indispensável para que engrene e tenha sustentabilidade enquanto negócio. "Se você faz um filme e não está preparado pra prestar contas, apresentar relatórios, mensurar resultados, aproveitar oportunidades de promoção, divulgação e consolidação de sua carreira, você vai estar sempre nas mãos dos outros", afirma o cineasta Wildes Sampaio.

Fazer arte e administrar ao mesmo tempo, como já disse Gabriel, da Móveis Coloniais de Acaju, não é fácil. No entanto, como explica Wildes, "é algo que quebra muito a cabeça. Mas, se você quer crescer, tem que encarar".

Esta matéria foi publicada na revista Administradores nº 2.

Siga os posts do Administradores no Twitter: @admnews.